Que bom que você está aqui!

É com prazer que te recebo neste espaço! Esta "casa" virtual está em permanente construção e em cada "cômodo" há uma inquietante necessidade de fazer diferente! Meus textos, relatos e imagens buscam apresentar a você os passos que constituem minha caminhada pessoal, profissional e acadêmica. A partilha que faço não intui caracterizar-se por uma postura doutrinária, autoritária ou impositiva-opressora, mas ao contrário, apresenta-se como ato solidário (jamais solitário) de contribuição à discussões humanas, planetárias e éticas!



Como educador me vejo no compromisso de participar do processo histórico de libertação dos oprimidos, marginalizados e esquecidos, a começar por mim. Despindo-me de qualquer resquício de arrogância, prepotência e soberba apresento-me como aprendente num contexto de intensa renovação de conceitos e atitudes!



Assim convido-o a juntos pensarmos em nossa condição de partícipes da grande Salvação! Salvação plena do homem e da mulher místicos, políticos e planetários!



Fraterno abraço!








Casa Rosada - sede do governo argentino. Em frente está a Praça de Maio. É um local em que é possível conhecer um pouco da história e da cultura argentina.

domingo, 19 de abril de 2009

A arte de adestrar animais, cultivar plantas e educar crianças.

Caro leitor, prezada leitora! Longe de pretender igualar animais, plantas e crianças, partimos do pressuposto que os três iniciam sua trajetória de convívio com humanos através do adestramento, cultivo e educação. É assim que os adultos procedem ao mesmo tempo em que ensinam aos pequenos que animais devem ser adestrados, plantas cultivadas e crianças educadas. Até aí não há problema! É deste jeito que aprendemos e ensinamos a ser gente!

O grande problema se dá quando os procedimentos se invertem. Imagine com seria o adestramento de crianças! Todas são ensinadas a fazer as mesmas coisas, ao mesmo tempo, respeitando comandos rígidos sem mesmo saber por quê. Crianças ensinadas a obedecer e se não obedecer, castigo! Se obedecer é premiada com “comidinhas”. O adestramento, felizmente, já prefere ao estímulo diante do acerto, ao castigo diante do erro. A criança já faz mais pela recompensa do que pelo medo do castigo.

Noutra perspectiva, imagine o cultivo de crianças. Todas plantadas distantes umas das outras, para que cresçam sem se tocar, crescendo robustas e o mais rapidamente possível, para ser abatidas. As que não crescem com o mesmo vigor, são sumariamente eliminadas pois não terão chance de disputar com “as grandes”. As copas destas árvores serão muito parecidas e suas sombras também, assim com seus odores e suas flores. Verdadeiros exércitos imóveis aguardando a oportunidade de tombar.

Mas felizmente crianças existem para ser educadas. Educadas para contribuir com suas qualidades e habilidades e receber àquilo que é necessário para viver e para que os outros também possam viver. Educadas para perceber sua existência como um compromisso de cuidado com o planeta, com os animais e com as plantas. Enfim educadas para serem felizes.

Assim não se admite mais que seres humanos pensem de acordo com as ordens que recebem esperando recompensas e temendo castigos. As “comidinhas” não podem ser suficientes para saciar os famintos por dignidade e felicidade. Muito menos as “migalhas” que costumam sobrar nos grandes banquetes dos arrogantes e prepotentes. Seria um espetáculo desesperador, tanto quanto ver animais humilhados participando de “espetáculos” circenses.

Não se admite também enfileirar milhares de criaturas enrijecidas aguardando ordens e esperando um lugar para, abatidas, descansar em paz. Crianças com a mesma expressão, uniformizadas, produzindo as mesmas coisas e outras apequenadas e sufocadas pelas “grandes”. Cultivadas para fornecer como seus frutos, as diferentes habilidades para o trabalho em grande abundância.

Mas como não se pretende comparar crianças, a animais e a árvores, a educação vem de distanciando do adestramento e do cultivo, embora seja necessário dizer que com certa resistência. Não se está propondo que seres humanos sejam abandonados a própria sorte, sem limites, regras de convivência e responsabilidades. Ao contrário, para conviver e aceitar a sua individualidade e a dos outros cada ser humano necessita conhecer seus limites e a maneira mais adequada possível de conviver, além de assumir responsavelmente as conseqüências de seus atos. Isto é educar.

Limites, regras de convivência e responsabilidades, precisam ser compreendidos a assumidos como forma de garantir dignidade e respeito para todos. Não serão obstáculos, mas alicerces que consolidam a caminhada de cada ser humano neste planeta. Precisamos de crianças que cumpram menos ordens e saibam assumir compromissos. Ordens são de efeito imediato e curto, compromissos são de efeito a longo prazo, por toda a vida. Se uma criança é proibida de jogar lixo na rua pode até cumprir esta ordem enquanto estiver sendo vigiada. Se for convencida de que o lixo lançado na rua pode causar tragédias ambientais e humanas, é provável que adote o hábito de não sujar em qualquer circunstância.

Definitivamente crianças, são crianças. Precisam e merecem ser tratadas como crianças. Elas serão adultas no futuro, mas não são necessariamente o futuro. São o presente, o aqui e o agora.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Tecnologia na educação: anarquia e complexidade

Tecnologia na educação: anarquia e complexidade




Resumo

A inserção da tecnologia no contexto educacional é inegável e irreversível assim como na vida humana. Vislumbram-se estudos sobre formas e métodos que possam otimizar esta presença e sobre a necessidade de políticas públicas que introduzam novas tecnologias no contexto educacional. No presente texto, abarca-se uma discussão em torno dos efeitos dessa inserção no processo educativo e sua efetiva aplicação na construção de seres humanos melhores, mais sensíveis, mais solidários e mais felizes. Os conceitos, anarquia e complexidade constituem-se em características intrínsecas ao contexto tecnológico e ao ser humano. Isto contribui para que o tema das tecnologias na educação seja discutido não apenas do ponto de vista metodológico ou financeiro, mas também humano. Há que se considerar que não se está inserindo um conjunto de máquinas num contexto humano, para mecanizá-lo, mas oportunizando meios para que haja maior e melhor interação entre o ser humano e o saber. A promoção da qualidade do encontro entre o ser humano e o saber é pois um desafio e uma atribuição às tecnologias, que se inserem no contexto educativo nas suas diversas modalidades.

Palavras-chave: Novas tecnologias. anarquia. complexidade. contexto humano.


Abstract
The insertion of the technology in the educational context is undeniable and irreversible as well as in the life human being. Studies on forms and methods are glimpsed that can optimize this presence and on the necessity of public politics that introduce new technologies in the educational context. In the present text, a quarrel around the effect of this insertion in the educative process and its effective is accumulated of stocks application in the construction of better, more sensible, more solidary and happyer human beings. The concepts, anarchy and complexity consist in intrinsic characteristics to the technological context and the human being. This contributes so that the subject of the technologies in the education is argued not only of the metodológico or financial point of view, but also human. It has that to consider itself that a set of machines in a human context is not being inserted, to mechanize it, but oportunizando half so that it has greater and better interaction between the human being and knowing. The promotion of the quality of the meeting between the human being and knowing is therefore a challenge and an attribution to the technologies, that if insert in the educative context in its diverse modalities.


Key words: New technologies. anarchy. complexity. human context.


Anarquia e complexidade


A compreensão de que métodos, fórmulas e regras pré-definidas podem se traduzir em resolutividade, é aplicável a vida moderna especialmente se for considerado o modelo cartesiano de compreender fenômenos e fatos. Graças a eles tem sido possível produzir mais, movimentar as economias, gerar trabalho, etc. Há uma crescente busca por compreender e criar novos métodos, fórmulas e regras que permitam atender a estas novas tendências. Para tal as instituições de ensino são vistas como verdadeiros seleiros destes métodos, fórmulas e regras, além de serem vistas como fonte inesgotável de sujeitos dispostos a se submeter a métodos, fórmulas e regras sem qualquer tipo de contestação, discordância ou crítica.

O quadro que sucintamente ora se descreve impõe uma discussão radical, ou seja, na gênese do que se pretende debater em relação a tecnologias aplicadas a educação. Supondo um ambiente avesso a obedecer rigorosamente a métodos, fórmulas e regras, seria possível imaginar a inserção de tecnologias? Estas tecnologias poderiam ser aplicadas a ambientes contestadores, discordantes e críticos como deveria ser o ambiente educacional? Ou o caminho seria inserir tecnologias, regrar o ensino, estabelecer limites, mecanizar os fenômenos e processos humanos?

Para a vertente que supõe as instituições de ensino com produtoras de formas adequadas de inserir os seres humanos no mercado de trabalho e do próprio mercado de trabalho, valores como contestação, discordância ou crítica são vistos como posturas verdadeiramente anarquistas. Inviabiliza o processo, tira a autoridade docente, desvirtua as instituições e estabelece uma desorganização insustentável para o modelo “ideal” de ensinar. Formar seres humanos independentes, versáteis, livres de regras de dominação e exploração é visto como um verdadeiro anarquismo. Um anarquismo perigoso que compromete e desgasta a qualidade do que se ensina. Pouco se considera o que se aprende, uma vez que cabe a instituição o dever de ensinar, e quem quiser, aprenda. Neste contexto as tecnologias servirão para aumentar a velocidade do ensinar e a quantidade do que é ensinado.

Há, entretanto, não apenas uma tendência, mas uma necessidade eminente de se pensar de forma diversa, discordante e ousada em relação a esta realidade posta. Retomando as perguntas anteriores é necessário dizer que uma das grandes vontades dos que pensam uma educação para o futuro é torná-la avessa a este rigor e outra é a de inserir práticas e métodos que se utilizem de tecnologias. Seriam estes dois passos compatíveis e associáveis? Seria possível imaginar onde se chegaria com tudo isso? “A história está repleta de ‘acidentes e conjunturas e curiosas justaposições de eventos’ e patenteia a nossos olhos a ‘complexidade das mudanças humanas e o caráter imprevisível das conseqüências últimas de qualquer ato ou decisão do homem” (FEYERABEND 1989, p. 19).

Ora, se a idéia é libertar o processo educativo de determinações e rigores, então uma das parceiras nesta jornada é a incerteza. Incerteza que ofereça condições mínimas de duvidar, (des)construir, (re)iniciar. “... o conhecimento é a navegação em um oceano de incertezas, entre arquipélagos de certezas”. Isto nos permite vislumbrar a proporção que existe entre elas e o quanto nos restringimos quando nos valemos da certeza para consolidar uma postura, um argumento (MORIN 2002, p. 86).

Assim a formação de cidadãos, tão ostentada por muitas instituições que apontam métodos e práticas de ensino, é no mínimo duvidosa. Ignorar o oceano que as circunda em nome de uma formação direcionada, linear pode preparar bons trabalhadores, excelentes executores de tarefas, mas cidadãos medíocres, nulos enquanto autores de sua existência.

Esta constatação determina outra: estamos num tempo de rupturas únicas na história, criando uma série de tensões e conflitos em relação a posturas e convicções. Constata-se que “... no final do século XX, o mundo se dá conta de que a história não se resume no fluxo das continuidades, seqüências e recorrências, mas que envolve também tensões, rupturas e terremotos” (IANNI 1997, p. 09). No campo educacional não seria diferente. Uma destas rupturas está na inserção de construções sociais e científicas como são as tecnologias.

Para tal são necessários certos cuidados, que demandam debates, pesquisas e ousadas ações. Fazer da tecnologia, parceira nesta ruptura conduz a questionamentos como: para que, como, com quem utilizar? É mais pertinente educar pela tecnologia ou para a tecnologia? Qual o risco da tecnologia enrijecer ainda mais as tradicionais concepções e práticas de ensino? Este tipo de questionamento nos remete a compreender que realmente se está num contexto propenso a anarquia. Assim “os anarquistas profissionais se opõem a qualquer tipo de restrição e exigem que ao indivíduo seja permitido desenvolver-se livremente, desembaraçado de leis, deveres e obrigações” (FEYERABEND 1989, p. 22). O caráter inovador das tecnologias e a necessidade de (re)construir permanentemente a relação do ser humano com o conhecimento parecem representar, além de uma ruptura, uma esperança em favor da qualificação desta relação.

A qualidade do conhecimento é determinada por inúmeras características dentre as quais o constante movimento de mobilidade organizativa. Considera-se que “o conhecimento deve ao mesmo tempo detectar a ordem (as leis e determinações) e a desordem, e reconhecer as relações entre ordem e desordem. O interessante é que a ordem e a desordem têm uma relação de complementariedade e complexidade” (MORIN 2000 p. 52). Admitir o movimento de articulação entre ordem e desordem implica em aceitar o elevado nível de complexidade inerente ao conhecimento e que determina sua qualidade como fruto de produção humana.

Tal qualificação pauta-se no compromisso de fazer da educação um espaço de celebração da diversidade e de redenção dos diferentes. Para tal inúmeras características necessitam ser consideradas: complexidade da unidade humana, solidariedade, afetividade, tolerância, conviviabilidade, etc. O conhecimento e seus métodos estabelecerão oportunidades e condições idênticas de acessibilidade ao saber, porém considerando tais características. Neste sentido

“Cabe à educação do futuro cuidar para que a idéia da unidade de espécie humana não apague a idéia de diversidade e que a da sua diversidade não apague a da unidade. Há uma unidade humana. Há uma diversidade humana. A unidade não está apenas nos traços biológicos da espécie Homo sapiens. A diversidade não está apenas nos traços psicológicos, culturais, sociais do ser humano. Existe também diversidade propriamente biológica no seio da unidade humana; não apenas existe unidade cerebral, mas mental, psíquica, afetiva, intelectual; além disso, as mais diversas culturas e sociedades têm princípios geradores ou organizacionais comuns. É a unidade humana que traz em si os princípios de suas múltiplas diversidades. Compreender o humano é compreender sua unidade na diversidade, sua diversidade na unidade. É preciso conceber a unidade do múltiplo, a multiplicidade do uno. A educação deverá ilustrar este princípio de unidade/diversidade em todas as esferas” (MORIN 2002, p. 55)

Assim, construir uma proposta de educação para o futuro não se limita apenas a estabelecer planos oficiais, articular políticas públicas de investimento, mas considerar e refletir a condição humana no contexto educacional e acadêmico. Na perspectiva das tecnologias, seres humanos não serão apenas usuários ou clientes, mas autores de sua existência que, através das contribuições das tecnologias, dinamizam o seu “que fazer”, assumindo este, características essencialmente humanas.

A humanidade a ser (re)construída permanentemente exige uma nova concepção de conhecimento, visto historicamente como uma elaboração sistemática, pautada na busca da verdade. A verdade, já se sabe, cientificamente não existe em seu caráter absoluto, conforme mas é possível afirmar que “o conhecimento é sempre falível, a verdade é sempre aproximada e provisória” (SANTOS 1989, p. 72). Dado o ritmo com que o conhecimento busca esta aproximação, os inúmeros caminhos tomados para alcançá-la lançam desafios de diversas ordens. Um deles é o mecânico, em que se tornam necessários instrumentos de otimização de tempo e recursos. Neste sentido as tecnologias podem oferecer contribuições significativas.

Estas contribuições, no entanto, são limitadas, pois o que determina sua eficiência não é exclusivamente a agilidade e a conectividade das operações, mas aquele ou aquela que as utiliza. Como mero usuário, será alguém apenas capaz de executar comandos e servirá apenas para ordenar ou impedir a execução de tarefas. Se for um agente construtor de sua existência perceberá o caráter imperfeito aderido ao conceito de conhecimento e, por conseguinte, de tecnologia. Esta conduta demanda para uma forte tendência a aceitação da crise como instrumento efetivo de construção do novo. Uma crise que não representa necessariamente uma falência múltipla e total, mas parcial, constante e previsível, a que a ciência já está articulada.

Neste sentido afirma-se que

“Novas tecnologias que apontam para uma linguagem da multiplicidade e para a crise de conceitos tão caros ao paradigma científico - como as noções de sujeito, identidade, razão e evolução/progresso -, desarmando, assim, esses princípios cientificistas. Nessa direção, as tecnologias pedagógicas passam a priorizar os processos que se apóiam num modelo ideal e perfeito de agir, naturalizando as diversas formas de vida. O que tentamos indicar é a urgência de se construírem outros planos para o processo educacional, apoiados numa ética em que os saberes são construídos nas práticas”. BARROS (2000)

Esta nova ética definitivamente não pode ser assimilada pela aquisição de novos softwares ou hardwares, ou pela utilização mecânica de qualquer outra tecnologia, mas pela relação estabelecida entre os seres humanos, os saberes, permeados pelas suas necessidades, vontades e possibilidades. O uso mecânico de tecnologias produz uma espécie de uniformidade que subtrai a identidade e individualidade dos sujeitos. Neste sentido “a proliferação de teorias é benéfica para a ciência, ao passo que a uniformidade lhe debilita o poder crítico. A uniformidade, além disso, ameaça o livre desenvolvimento do indivíduo” (FEYERABEND 1989, p. 45). Esta liberdade é irrenunciável e intransferível e a tecnologia há que servir a estas características. É a sua função diante da complexidade anunciada e inerente ao ser humano. Se ao contrário, for motivo de cerceamento da liberdade humana, então a tecnologia deve ser motivo de renuncia e transferência do contexto educacional para qualquer outro.

Esta complexidade que emana do livre desenvolvimento humano consiste em celebrar a vida em sua plenitude, sem, no entanto, distanciar-se da cientificidade necessária aos ambientes de formação humana. Há quem aposte na racionalidade absoluta, onde ciência e humanidade são valores incompatíveis entre si. “A paixão é incompatível com o conhecimento científico, precisamente porque a sua presença na natureza humana representa a exata medida da incapacidade do homem para agir e pensar racionalmente” (SANTOS 1989 p. 117-8). É, pois, uma concepção um tanto radicalista, pois seria utópico e até cruel supor que exista num mesmo ser um compartimento que o faz racional e outro que o faz emotivo.

Seria como se lançar, desta forma, a perigosa renúncia da condição humana que compreende a complexa relação de incontáveis valores concretos e subjetivos que circunscrevem a existência humana. Uma vida sem paixão é apenas uma seqüência de execução de tarefas e cumprimento de atribuições que em nada recordam os princípios ligados à complexidade. A racionalidade, neste contexto serve como limitador, enrijecendo a ciência, criando mitos em torno dos quais se impõe certos preconceitos como o que faz acreditar que a ciência é para poucos entenderem.

Assim, o anarquismo que se propõe é o que considera a complexidade como instrumento de consolidação da imprevisibilidade, vista como fruto da liberdade inerente a qualquer ser humano. Reconhecer isto é um passo decisivo em direção a aceitação permanente dos diferentes nos espaços educativos. Isto impõe também a idéia de que cada ser humano aprende de forma única, de acordo com seus interesses, necessidades, valores e concepções. O conhecimento poderá então servir para consolidar ou mudar estes interesses, necessidades, valores e concepções, mas jamais ignorá-los.

A complexidade a que se faz referência não se resume àquela intrínseca ao indivíduo, mas ao contexto em que este se encontra. Neste sentido

“A acção educativa sempre se revestiu de uma grande complexidade e de margens significativas de imprevisibilidade. Estas características são ainda mais marcadas nos dias de hoje, devido à presença na escola de crianças de todas as origens sociais e culturais, bem como à democratização do acesso às mais variadas tecnologias de informação e comunicação” (NÓVOA 1999).

Estas variáveis exigem também um educador e uma educadora diferenciados. Para alguns pode representar um desafio, uma verdadeira luta, pois temem perder espaço e importância frente aos atrativos oferecidos pelas tecnologias. Outros se sentem fortalecidos, pois percebem que a tecnologia é um fator que agrega agilidade e versatilidade ao processo educativo.

Mesmo este segundo grupo há de ser permanentemente considerado, pois o processo educativo necessita não apenas versatilidade e agilidade. Há um conjunto de outros aspectos e valores que transcendem os limites mecânicos que a tecnologia pode oferecer. Assim é possível dizer que a inexistência de tecnologias não significa inoperância do processo educativo.

Neste sentido é preciso novamente recorrer à complexidade como forma de explicar a dinâmica do fazer humano. Além disso, é preciso compreender que o ser humano não está só, mas ao contrário, é fruto bio-psico-socio-transcendente de uma realidade contextual, temporal e planetária. Este verdadeiro caldo de concepções constitui-se noutra percepção da complexidade. Assim

“é a complexidade (a cadeia produtiva/destrutiva das ações mútuas das partes sobre o todo e do todo sobre as partes) que apresenta problemas. Necessitamos, desde então, conceber a insustentável complexidade do mundo no sentido de que é preciso considerar a um só tempo a unidade e a diversidade do processo planetário, sua complementaridades ao mesmo tempo que seus antagonismos. O planeta é um sistema global, mas um turbilhão em movimento, desprovido de centro organizador”. O planeta exige um pensamento policêntrico capaz de apontar o universalismo, não abstrato, mas consciente da unidade/diversidade da condição humana; um pensamento policêntrico nutrido das culturas do mundo. Educar para este pensamento é a finalidade da educação do futuro, que deve trabalhar na era planetária, para a identidade e a consciência terrenas” (MORIN 2002, p. 64-5).

Desvela-se assim outra possível atribuição das tecnologias: aproximar o ser humano da unidade/diversidade que o constitui e que o cerca. A facilidade e a diversidade com que as informações são disseminadas pelas tecnologias, torna a complexidade mais acessível a quem, por sua vez, acessa as tecnologias, porém, representa um retrocesso para quem não tem esta disponibilidade.

Outro risco possível é o da padronização de pensamentos e concepções sem considerar peculiaridades anunciadas pela complexidade. O uso das tecnologias é, portanto, muito mais do que modificar a cor da sala de aula, a disposição de carteiras e cadeiras, etc. Mas como qualquer criação humana, merece ser analisada nas suas múltiplas faces. Desta forma

“não se trata, portanto, de um questionamento oposicionista ao uso da tecnologia no mundo moderno, nem de uma negação da importância de o país investir nesse caminho, mas de se perguntar porque optar por um programa de massa, potencialmente homogeneizador, para atender a uma realidade onde a disparidade e o entrecruzamento de tempos históricos é o denominador comum? Como colocar no mesmo "balaio" o Vale do Jequitinhonha e a "Califórnia" paulista, o Sertão piauiense e o Vale do Itajaí?” (FARAH NETO)

Assim, políticas públicas em educação, precisam necessariamente considerar este fato, pois um computador, um aparelho de DVD mal utilizados, são tão inúteis quando um mapa ou um livro didático mal escolhidos. Este cuidado emana do comprometimento de educadores e educadoras, gestores e gestoras e requer uma constante renovação deste comprometimento. Esta é uma discussão que não se esgota aqui, mas que também pode ser compreendido inerente a um ambiente em que residem harmoniosamente o anarquismo e a complexidade.




Tecnologia na educação e construção de cidadania


A compreensão e percepção sensível dos diferentes aspectos da organização institucional da educação denuncia uma série pré-conceitos. Um deles é que cabe a educação oferecer compulsoriamente todos os saberes acumulados e sistematizados pela humanidade ao longo da história. O fato em si não é problemático, desde que, este não seja o fim último e que estes saberes não sejam percebidos como verdades. A gravidade disto está no fato de que “as leis científicas são suscetíveis de revisão e, com freqüência, notamos não apenas que elas apresentam aspectos incorretos, mas que são inteiramente falsas...” (FEYERABEND 1989, p 292). Se a apresentação dos saberes historicamente constituídos for um dos passos rumo a construção efetiva e concreta de um sujeito crítico, solidário, ético e flexível, está se cumprindo uma das funções para a qual a educação foi articulada por seres humanos.

Este conjunto de características e tantas outras, a ser impresso nos educando e educandas lança a educação a um desafio de transcendência e a instituição de ensino a um exercício permanente de questionamento e dúvida. Esta dúvida não se limita apenas a questionar os métodos e processos utilizados para alcançar um determinado saber, mas também as suas implicações em relação à vida humana e planetária. A ética surge como princípio a ser observado e incorporado ao ato de fazer, divulgar e aplicar ciência. Neste sentido é possível afirmar que
“o ser humano deverá ser formado para a ação cooperativa, para a solidariedade, para a aceitação do outro, para a noção de limites e para construir a noção de dever. Neste plano, estamos ingressando no que se deve entender como o da formação e desenvolvimento dos princípios da Ética e da Moral, necessários a todos os homens. Somente neste plano pode-se considerar completa a tarefa do que se diz por Educação” (RODRIGUES 2001).
Isto demonstra a complexidade inerente à educação e a necessidade dela assumir um caráter universal. Princípios éticos precisam ser de todos, para todos e por todos. Todo o ser humano tem por direito e dever assumir uma postura ética diante de sua existência. Mesmo utópica, a formação plena se consolida através da possibilidade de assumir um caráter ético e universal.

A consolidação dos valores éticos na educação transcende os limites do formalismo e dos métodos convencionais da educação pautada em práticas que privilegiam o repasse de conteúdos ultrapassados. Exige-se uma atitude cidadã da educação para que ela possa formar cidadania junto aos seres humanos nela inseridos. A educação cidadã é aquela para a qual, “educar significa, então, capacitar, potencializar, para que o educando seja capaz de buscar a resposta do que pergunta, significa formar para a autonomia” \9GADOTTI 1999, p. 10),. Definitivamente esta autonomia não se conquista percorrendo os formalismos organizacionais convencionais, mas pelos múltiplos caminhos diversos e múltiplos do anarquismo da complexidade humana.

A tecnologia nas suas múltiplas formas de utilização e manifestação assume um compromisso ainda maior quando aplicadas à educação: a geração de cidadania. O universo virtual, por exemplo, representa um mundo de informações, saberes e conceitos, que precisa, como um direito humano, estar ao alcance de todos os cidadãos e cidadãs. Esta consolidação como direito humano não ocorre de forma espontânea, mas pelo constante exercício de cidadania. Este exercício independe de tecnologias, é inclusive precedente a estas. Pode haver educação sem tecnologia mas não sem cidadania. Se houver não será educação que atente para a complexidade existente em cada ser humano. Neste sentido a tecnologia pode exercer papel importante no sentido de versatilizar e consolidar esta característica humana.

Na perspectiva da educação exercer um papel fundamental no sentido da formação de cidadãos e cidadãs pode afirmar que

“a educação das crianças está diretamente relacionada com a cidadania, e, quando o Estado garante que todas as crianças serão educadas, este tem em mente, sem sombra de dúvida, as exigências e a natureza da cidadania. Está tentando estimular o desenvolvimento de cidadãos em formação. O direito à educação é um direito social de cidadania genuíno porque o objetivo da educação durante a infância é moldar o adulto em perspectiva. Basicamente, deveria ser considerado não como o direito da criança freqüentar a escola, mas como o direito do cidadão adulto ter sido educado” (CURY 2002).

O cidadão adulto, gerado a partir das crianças deste tempo, será aquele que conhece com propriedade a complexidade que envolve o mundo virtual. Complexidade que envolve as intenções das fontes de informações lançadas na grande rede, por exemplo. Das induções a que se está sujeito diante de imagens, sons e produções apresentadas deliberadamente e que parecem imperceptíveis de pouca incisão.

Cidadania implica também em saber discernir e perceber o verdadeiro alcance das tecnologias no contexto da formação cidadã de homens e mulheres. Neste sentido considera-se que
“Se, por um lado, os avanços tecnológicos criaram novas possibilidades para o livre fluxo de informações, o uso de redes sociais e o ativismo global, por outro lado, há também o potencial que as empresas e governos exercem de ampliar seu controle sobre os meios de comunicação, restringir o fluxo de informações e apropriar-se dessas novas ferramentas para o seu próprio lucro e controle, à custa da livre expressão e da democracia” (KELLNER e SHARE 2008).
Assim, nota-se que é fundamental exercitar permanentemente a cidadania, pois através dela é possível gerar não apenas usuários, mas críticos de informação e de ambientes virtuais. Sujeitos que se utilizam das informações e não o contrário. Considerando o universo de saberes situado nos espaços virtuais, há que se afirmar e consolidar a necessidade de se vislumbrar as possibilidade de sua aplicação num contexto conhecido pelos seres humanos.

Desta forma um conhecimento torna-se pertinente a partir do momento em que é aderido a uma função social, humana e planetária. Neste sentido “ o conhecimento pertinente é o que é capaz de situar qualquer informação em seu contexto e, se possível, no conjunto em que está inscrita. Podemos dizer até que o conhecimento progride não tanto por sofisticação, formalização e abstração, mas principalmente, pela capacidade de contextualizar e englobar” (MORIN 2005, p.15). A pertinência pela contextualidade e globalidade que um conhecimento apresenta, pode ser um critério a ser observado quando da análise de um saber quanto a sua fonte, origem e intencionalidade. Eis um novo campo de entendimento em relação à complexidade, frequentemente anunciada.

Diante disto, é possível dizer que cidadania é um conceito tão complexo quanto o de ser humano e por isso não se esgota numa discussão teórica como a ora apresentada. Não há tecnologia que supere o contato afetivo e solidário entre seres humanos, e se este contato contar com a participação de alguma tecnologia, então poderá haver maior rapidez e flexibilidade na assimilação do conceito de “ser cidadão e cidadã”. Assim

“um professor que se mostra competente, humano, afetivo, compreensivo atrai os alunos. Não é a tecnologia que resolve esse distanciamento, mas ela pode ser um caminho para a aproximação mais rápida: valorizar a rapidez, a facilidade com que crianças e jovens se expressam tecnologicamente ajuda a motivá-los, a querer se envolver mais” (MORAN 2007, p. 81).


Nesta perspectiva se justificam investimentos e políticas públicas em favor da aquisição de tecnologias para os ambientes educativos, do contrário a tela do computador será tão útil quanto um quadro negro e vídeos, tão atrativos quanto os velhos álbuns seriados.




Conclusão


A inserção de tecnologias no contexto educacional motiva inúmeras discussões produzindo dialeticamente diferentes concepções acerca de sua relevância. A definição de políticas públicas em favor da implementação de práticas pedagógicas capazes de, utilizando a tecnologia, preservar e elevar valores essencialmente humanos.

Salas tomadas de recursos tecnológicos e educadores e educadoras amplamente treinados para utilizá-los não representam necessariamente qualidade no processo educativo. Ao contrário, o conceito de qualidade do ato educativo, transcende a superficialidade destes entendimentos.

Assim, há que se impedir a percepção ilusória de que há soluções absolutas para todas as demandas do processo educativo. Ao contrário, é preciso consolidar a necessidade permanente de se estabelecer discussões que permitam otimizar espaços e recursos e acima de tudo promover a redenção do ser humano. Tal redenção se dará pelo compromisso de cada homem e de cada mulher em favor da vida.

A vida, como fundamento de todo o comprometimento humano, gera a necessidade da não-linearidade e da liberdade de lançar-se ao novo e ao diferente. Neste contexto se reconhece a anarquia e a complexidade como instrumentos permanentes de comprometimento e ação em favor da defesa dos valores planetários. A tecnologia será sempre um tema de grande presença nas discussões em torno dos diferentes paradigmas que emanam do processo permanente de humanização.





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS. Maria Elizabeth Barros de. Procurando outros paradigmas para a educação. 2000 Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302000000300003&lng=pt&nrm=iso. Acesso em 28/02/06 as 15h50min.
CURY, Carlo Roberto Jamil. Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. 2002. Disponível: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742002000200010&lng=pt&nrm=iso . Acesso: 23.02.09
FARAH NETO, Miguel e SOUZA Solange Jobim. Considerações sobre a tirania da imagem na educação: educação à distância e cultura do consumo. Disponível em: http://www.educacaoonline.pro.br/consideracoes_sobre_tirania.asp?f_id_artigo=161 . Acesso: 12.12.08
FEYERABEND, Paul. Contra o método. Tradução: Octanny da Mota e Leônidas Hegenberg. 3ª edição. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989.

GADOTTI, Moacir. Escola cidadã. 5ª edição. São Paulo: Cortez, 1999. – (Coleção da Nossa Época; v. 24).

IANNI, Octavio. A era do globalismo. 3ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997.
KELLNER, Douglas e SHARE, Jeff. Educação para a leitura crítica da mídia, democracia radical e a reconstrução da educação. 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302008000300004&lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 24.02.09
MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Tradução: Eloá Jacobina – 11ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários a Educação do futuro. Tradução: Catarina Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya. 5a edição. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2002.

MORIN, Edgar e LE MOINGNE, Jean-Louis. A inteligência da complexidade. Tradução: Nurimar Maria Falci. São Paulo: Peirópolis, 2000. (Série Nova Consciência).
NÓVOA, António. Os professores na virada do milênio : do excesso dos discursos à pobreza das práticas. 1999. Disponível: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97021999000100002&lng=pt&nrm=isso. Acessado em 27/02/06 as 15h15min.
RODRIGUES, Neidson. Educação: da formação humana à construção do sujeito ético. 2001. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex&pid=S0101-733020001000300013&lng=pt&nrm=iso. A acesso em: 23.02.09

SANTOS, Boaventura de Souza. Introdução a uma ciência pós-moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Quem sou eu

Minha foto
Benedito Novo, Santa Catarina, Brazil
Sou Mestre em educação, graduado em Biologia e Matemática, professor da rede estadual de Santa Catarina, com experiência em educação a distância, ensino superior e pós-gradução. Sou autor e tutor de cursos na área da educação no Instituto Veritas (Ascurra) e na Atena Cursos (Timbó). Também tenho escrito constantemente para a Coluna "Artigo do Leitor" do "Jornal do Médio Vale" e para a revista eletrônica "Gestão Universitária". Fui diretor da EEB Frei Lucínio Korte (2003-2004) e secretário municipal da Educação e Promoção Social de Doutor Pedrinho (2005). Já atuei na rede municipal de ensino de Timbó. Em 2004 coordenei a campanha que conduziu à eleição do Prefeito Ercides Giacomozzi (PMDB) à prefeitura de Doutor Pedrinho. Em 2011 assumi pela segunda vez, a direção da EEB Frei Lucínio Korte.